Caim, de José Saramago, à luz das emoções aristotélicas

Autores/as

DOI:

https://doi.org/10.14198/hexis.29900

Palabras clave:

Aristóteles, Caim, cólera, emoções, ira, José Saramago, reescritas bíblicas, reescritas mitológicas, retórica

Resumen

A cultura europeia ocidental tem Rómulo e Remo, Caim e Abel como arquétipos das relações fraternas e fratricidas, demonstrando uma força seminal da mitologia e da História muitas vezes impulsionada pelo litígio, pelo conflito, pelo paradoxo, e ambivalência, na tensão de forças contrárias e contraditórias. José Saramago revisita alguns episódios do Antigo Testamento, no romance Caim, num exercício retórico de síntese e amplificatio para caricaturar a natureza humana e divina. O propósito do romance não é o ataque à religião mas alegorizar a Humanidade que a criou. O âmago é a violência nas suas múltiplas manifestações, desnudando as ações de um deus sádico, irado, caprichoso, vingativo e invejoso. As emoções expandem-se pelo núcleo feminino, que enriquecem as passiones animi com os seus afectos, medos, impulsos, chantagens e loucuras. O presente trabalho pretende analisar o romance saramaguiano Caim, numa perspectiva da retórica das emoções, sob o molde de alguns preceitos aristotélicos sem desconsiderar a divergência que muitos destes conceitos têm nas noções modernas. Numa primeira parte, reconheceremos que os desvios e paródias contribuem para a reescrita mitológica e bíblica, assente na posição post-modernista entre História e Ficção; numa segunda parte, iremos identificar a palete de emoções e estados internos de sentimentos, colocando a lupa nos episódios mais disfóricos e distópicos. Daremos especial enfoque à cólera/ira decorrentes de comportamentos de desdém, insulto e menosprezo. O pano de fundo não é a relação de Caim e Abel mas antes de Caim com Deus, colocando-os como antagonistas, com ênfase para a dimensão trágica, sem margem para remissões, nesta relação violenta, conturbada e insanável.

Citas

Alagoa, Luiza (2009): «Escrevo para desassossegar». TVI Notícias (03/11/2009) [https://tvi.iol.pt/noticias/esta-e-boca/saramago/escrevo-para-desassossegar (acesso: 09/07/2025)].

Aristóteles (1985): Ética Nicomáquea. Ética Eudemia. Introducción por Emilio Lledó Íñigo. Traducción y notas por Julio Pallí Bonet. Madrid: Gredos.

Aristóteles (1998): Retórica. Tradução e notas de Manuel Alexandre Júnior. Lisboa: Imprensa Nacional – Casa da Moeda.

Aristóteles (2003): Poética. Tradução, prefácio, introdução, comentário e apêndices de Eudoro de Souza. Lisboa: Imprensa Nacional – Casa da Moeda.

Arnaut, Ana Paula (2002): Post-Modernismo no romance português contemporâneo. Fios de Ariadne. Máscaras de Proteu. Coimbra: Almedina.

Bergeret, Jean (1994): La violence et la vie. La face cachée de l’Oedipe. Paris: Payot.

Burke, Edmund (1757): A Philosophical Enquiry Into the Origin of Our Ideas of the Sublime and Beautiful. Oxford: Oxford University Press, 1990.

Fonseca López, Rosario (2019): Las Emociones y la Retórica Interpersonal en Platón y Aristóteles. Una perspectiva filosófica. Londres: Editorial Académica Española.

Fortenbaugh, William W. (1975): Aristotle on Emotion. A Contribution to Philosophical Psychology, Rhetoric, Poetics, Politics and Ethics. London: Duckworth.

Gibert, Pierre (2007): Biblia y violencia. La esperanza de Caín. Bilbao: Ediciones Mensajero.

Hutcheon, Linda (1991): Poética do Pós-Modernismo: história, teoria, ficção. Tradução de Ricardo Cruz. Rio de Janeiro: Imago Editora.

Kapsambelis, Vassilis (2016a): «Hypnos». Em: Zawieja [ed.] (2016), pp. 440-443. https://doi.org/10.3917/droz.zawie.2016.01.0440

Kapsambelis, Vassilis (2016b): «Morphée». Em: Zawieja [ed.] (2016), p. 571. https://doi.org/10.3917/droz.zawie.2016.01.0571

Konstan, David (2000): «A raiva e as emoções em Aristóteles: as estratégias do status». Letras Clássicas, 4: 77-90. https://doi.org/10.11606/issn.2358-3150.v0i4p77-90

Konstan, David (2004): «Las emociones en la antigüedad griega». Pensamiento y Cultura, 7: 47-54.

Konstan, David (2005): “Clemency as a Virtue”. Classical Philology, 100: 337-346. https://doi.org/10.1086/500436

Konstan, David (2006): The Emotions of the Ancient Greeks. Studies in Aristotle and Classical Literature. Toronto: University of Toronto Press. https://doi.org/10.3138/9781442674370

Konstan, David (2010): Before Forgiveness. The Origins of a Moral Idea. Cambridge: Camdridge University Press. https://doi.org/10.1017/CBO9780511762857

Leighton, Stephen R. (1982): «Aristotle and the Emotions». Phronesis. A Journal for Ancient Philosophy, 27: 144-174. https://doi.org/10.1163/156852882X00104

Lucas, Juan Ramón (2009): «En noches como esta con José Saramago». RTVE Play: En noches como esta (13/11/2009) [https://www.rtve.es/play/videos/en-noches-como-esta/joe-saramago/804574/ (acesso: 09/07/2025)].

Martins, José Cândido de Oliveira (2022): «Modos de paródia na escrita de José Saramago». Cincinnati Romance Review, 52: 17-34.

Mota-Ribeiro, Silvana (2000): «Ser Eva e deve ser Maria: paradigmas do feminino no Cristianismo». Em: IV Congresso Português de Sociologia. Universidade de Coimbra. 17-19 de Abril. Oeiras: Celta Editora, 2002, pp. 1-26 [https://repositorium.sdum.uminho.pt/handle/1822/5357 (acesso: 16/04/2025)].

Reis, Carlos (2015): Diálogos com José Saramago. Lisboa: Porto Editora.

Saramago, José (2009): Caim. Lisboa: Caminho.

Striker, Gisela (2022): «Emotion in Context: Aristotle’s Treatment of the Passions in the Rhetoric and His Moral Psychology». Em: Striker, Gisela: From Aristotle to Cicero. Essays in Ancient Philosophy. Oxford: Oxford University Press, pp. 112-127. https://doi.org/10.1093/oso/9780198868385.003.0009

Tavares, Gonçalo M. (2010): Uma Viagem à Índia. Lisboa: Caminho.

Zawieja, Philippe [ed.] (2016): Dictionnaire de la fatigue. Genève: Droz. https://doi.org/10.3917/droz.zawie.2016.01.0697

Publicado

10-07-2025

Cómo citar

Correia-Martins, A. I. (2025) «Caim, de José Saramago, à luz das emoções aristotélicas», Hexis. Revista Iberoamericana de Retórica, (1), pp. 51–68. doi: 10.14198/hexis.29900.

Número

Sección

Dosier monográfico